sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Masoquista


  Eu gosto da distância, da dor. Do sangue escorrendo, das fisgadas infindas no coração e pontadas pelo interior. Do cérebro sendo retorcido por pensamentos invasores e raramente maleáveis. Gosto de sofrer por amores, e amar por solidão. Do uso, do abuso e do embevecer de uma paixão. Das lágrimas que escorrem cortando a face. Gosto de ter alguém para despedir-me mais cedo ou mais tarde…
  Travar os lábios com os dentes e suportar o tapa sem mão, que faz-se por culpa de um adeus. Recolher dentro de mim pedaço por pedaço seu, e emoldurar pra não esquecer. Logo após pensar que estou vazia, e de modo irônico me encher das lembranças do que poderia ser real.
  Preservo a angústia e o desprazer de me culpar. Olhar para o lado, sentir o peito em volúpia ser apertado, e me afogar. Por dentro… Para o ego e para a alma, reconhecer que não tenho por perto a minha flor…

  Gosto de sair na chuva e passar a noite com febre. Ficar esperando a morte por conta de simples espirros e temperatura alta. Cobrir-me até a cabeça e ficar sussurrando que isso vai passar. Não o mal estar, mas a vontade de não mais levantar.
  Gosto de me meter em esparrelas e me auto-sustentar. Apenas para me sentir mais forte. Me ver no erro e ecoar dentro de mim o acerto, para então reconhecer que não sou só fracasso.
  Transformar em nó o que um dia foi laço, e olhar pra trás como quem desfaleceu… Descobrir que certas coisas não tem volta, e deixar tomar conta de mim a revolta. Como quem nunca se orgulhou, por errar… Como se o erro não fosse também capaz de nos livrar, de um futuro inesperado.

  Tenho prazer em me sentir sufocada pela emoção. Não saber o que falar, querer escrever e ter mais para pensar, do que para transcrever. Olhar para o luar e me sentir tão fria à ponto de não enxergar eu e você. E chorar… Por ter dias em que não me sinto sentimental. Chorar por saber que muitas vezes a frieza me faz mal. Todavia põe em prática a racionalidade forte que eu queria, constantemente ser… e que congela o pouco que me resta de coração.
  Porém acordar no dia seguinte e me fazer superior. Fumar um cigarro afirmando não ser um vício. E expressar pelo olhos que é apenas um modo solícito de receber uma morte mais depressa.
 
  Gosto do atraso da espera, das coisas que não acontecem e ficam apenas por se concretizar. Gosto de olhar para a minha mão pútrida com cheiro de nicotina, sentir meus lábios perdidos em uma cinzenta neblina e me repugnar… Me fazer forte e reconhecer que me rendo à morte, por ser mais fácil fraquejar… Então largar o cigarro. Vestir com brado um fardo pesado. Fardo de quem tem amor para cuidar… Não por si próprio, mas por um coração que diante tantos momentos inglórios, disponibilizou-se por me amar. Alguém que reconheceu interesses cheios de fundamentos, nessa feição largada. De quem olha para o rastro de sangue deixado, e sussurra um tanto faz. Quando ainda encontra-se extremamente fraca pelo que ficou para trás.

  Gosto dos recomeços e das renovações. Gosto das novidades que me deixam sem chão, como também gosto da monotonia que faz-me sentir em casa. Gosto de ter o controle e ver as coisas de forma clara, como também gosto de deixar descontrolar e escurecer.
  Gosto da ironia e da invulnerabilidade. Ter um jeito sádico e gostar do distorcer das situações. Do sentir por inteiro, pelo avesso ou pela metade quaisquer que sejam as sensações. Apenas sentir…
  Sinto então que gosto do gostar. Gosto mesmo, do viver mesmo que seja sobrevivência o que faço desde o amanhecer… E que eu viva por amar, viva por melhorar, progredir e enfim morrer. Viva eu por mim ou por você…
  Sou masoquista, meu bem. Masoquismo é como a sombra de uma árvore. Sobreposta pela representação da vida de um ser.

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